sábado, maio 24, 2008
Jefferson Péres
Morreu nesta sexta-feira, por volta das 6 horas, em Manaus, o senador Jefferson Perez. Aos 76 anos o senador amazonense ainda lutava bravamente pela ética na política. Creio que a maioria de meus pequenos leitores não sabem nada sobre ele. Entendo que os dois discursos que postarei abaixo representam leitura obrigatória, principalmente para jovens descrentes na política. Ambos discursos, um de 2006 e o outro de 2008 (seu último discurso) são as melhores portas para adentrarmos o coração e a mente de um dos últimos políticos com espírito público do Brasil. Infelizmente, para quem ler seus discursos, a porta de entrada será a mesma da saída.
Discurso de Jefferson Péres (2006)
Pronunciamento do Sen. Jefferson Peres em 30.08.2006 no plenário do Senado Federal.
"Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, depois de uma longa ausência de algumas semanas, volto a esta Tribuna para manifestar o meu desalento com a vida pública deste País.
Gostaria de estar aqui discutindo, a respeito das riquezas naturais do Brasil, e não como falarei, sobre algo muito pior: a dilapidação do capital ético deste País.
Senador José Jorge, poderíamos não ter um barril de petróleo nem um metro cúbico de gás, mas poderíamos ser uma das potências mundiais em termos de desenvolvimento.
O Japão não tem nada. Não tem petróleo, gás ou riquezas minerais. A Coréia do Sul também não tem nada disso, e nos dá um banho em termos de desenvolvimento não apenas econômico, mas também humano.
O que está faltando mesmo a este País e sempre faltou é uma elite dirigente com compromisso com a coisa pública, capaz de fazer neste País o que precisaria ser feito: investimento em capital humano.
Vejam que País é este. Estamos aqui com seis Senadores em pleno mês de agosto, porque estamos em recesso branco. Por que não se reduz a campanha eleitoral a trinta dias e transfere-se o recesso de julho para setembro? Nós ficaríamos com o Congresso aberto, de Casa cheia, até 31 de agosto. Faríamos trinta dias de campanha em recesso oficial, remunerado.
Estamos aqui no faz-de-conta. Como disse o Ministro Marco Aurélio, este é o País do faz-de-conta. Estamos fingindo que fazemos uma sessão do Senado, estamos em casa sem trabalhar. Estou em Manaus há quase um mês, recebendo, sem fazer nada " para o Congresso Nacional, pelo menos. Como se ter animação em um País como este com um Presidente que, até poucos meses atrás, era sabidamente " como o é " um Presidente conivente com um dos piores escândalos de corrupção que já aconteceu neste País e este Presidente está marchando para ser eleito, talvez, em primeiro turno? É desinformação da população? Não, não é. Se fizermos uma enquete em qualquer lugar deste País, todos concordarão, ou a grande maioria, que o Presidente sabia de tudo. Então, votam nele sabendo que ele sabia. A crise ética não é só da classe política, não. Parece que ela atinge grande parte da sociedade brasileira. Ele vai voltar porque o povo quer que ele volte. Democracia é isso. Curvo-me à vontade popular, mas inconformado. Esta será uma das eleições mais decepcionantes da minha vida. É a declaração pública, solene, histórica do povo brasileiro de que desvios éticos por parte de governantes não têm mais importância. Isso vem até da classe dos intelectuais, dos artistas. Que episódio deplorável aquele que aconteceu no Rio de Janeiro semana passada! Artistas, numa manifestação de solidariedade ao Presidente, com declarações cínicas, desavergonhadas! Um compositor dizer que "política é isso mesmo, fez o que deveria fazer", o outro dizer que "política é meter a mão na 'm...'"! Um artista, em qualquer país do mundo, é a consciência crítica de uma nação. Aqui é essa, é isso que é a classe artística brasileira, pelo menos uma grande parte dela, é o povo conivente com isso.
E pior, pior ainda: os artistas estão fazendo isso em interesse próprio, porque recebem de empresas públicas contratos milionários - isso é a putrefação moral deste País - , e o povo vai reconduzir o Presidente porque "política é isso mesmo".
Tenho quatro anos de Senado. Não me candidatarei em 2010, não quero mais viver a vida pública. Vou cumprir o mandato que o povo do Amazonas me deu, não vou silenciar. Ele pode ser eleito com 99,9%. Eu estarei aí na tribuna dizendo que ele deveria ter sido mesmo destituído.
O que ele fez é muito grave. É muito grave. Curvo-me à vontade popular, mas não sem o sentimento de profunda indignação. A classe política já nem se fala, essa já apodreceu há muito tempo mesmo. Este Congresso que está aqui, desculpem-me a franqueza, é o pior de que já participei. É a pior legislatura da qual já participei. Nunca vi um Congresso tão medíocre. Claro, com uma minoria ilustre, respeitável, a quem cumprimento. Mas uma maioria, infelizmente, tão medíocre, com nível intelectual e moral tão baixo, eu nunca vi. O que se pode esperar disso aí? Não sei. Eu não vou mais perder o meu tempo. Vou continuar protestando sempre, cumprindo o meu dever. Não teria justificativa dizer que não vou fazer mais nada. Vou cumprir rigorosamente o meu dever neste Senado até o último dia de mandato, mas para cá não quero mais voltar, não!
Um País que tem um Congresso desse, que tem uma classe política dessa, que tem um povo... dizem que político não deve falar mal do povo. Eu falo, eu falo. Parte da população que compactua com isso? É lamentável. E que sabe. Não é por desinformação, não. E que não é só o povão, não. É parte da elite, inclusive intelectual. Compactuam com isso é porque são iguais, se não piores. Vou continuar nessa vida pública? Para quê, para mim, chega!
Vou continuar pelejando pelos jornais e por todos os meios possíveis, mas, como ator na vida política e na vida pública deste País, depois de 2010, não quero mais! Elejam quem vocês quiserem! Podem chamar até o Fernandinho Beira-Mar e fazê-lo Presidente da República - ele não vai com o meu voto, mas, se quiserem, façam-no.
O meu desalento é profundo. Deixo isso registrado nos Anais do Senado Federal. Infelizmente, eu gostaria de estar fazendo outro tipo de pronunciamento, mas falo o que penso, perdendo ou não votos " pouco me importa". Aliás, eu não quero mais votos mesmo, pois estou encerrando a minha vida pública daqui a quatro anos, profundamente desencantado com ela.
Muito obrigado, Sr. Presidente".
"Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, depois de uma longa ausência de algumas semanas, volto a esta Tribuna para manifestar o meu desalento com a vida pública deste País.
Gostaria de estar aqui discutindo, a respeito das riquezas naturais do Brasil, e não como falarei, sobre algo muito pior: a dilapidação do capital ético deste País.
Senador José Jorge, poderíamos não ter um barril de petróleo nem um metro cúbico de gás, mas poderíamos ser uma das potências mundiais em termos de desenvolvimento.
O Japão não tem nada. Não tem petróleo, gás ou riquezas minerais. A Coréia do Sul também não tem nada disso, e nos dá um banho em termos de desenvolvimento não apenas econômico, mas também humano.
O que está faltando mesmo a este País e sempre faltou é uma elite dirigente com compromisso com a coisa pública, capaz de fazer neste País o que precisaria ser feito: investimento em capital humano.
Vejam que País é este. Estamos aqui com seis Senadores em pleno mês de agosto, porque estamos em recesso branco. Por que não se reduz a campanha eleitoral a trinta dias e transfere-se o recesso de julho para setembro? Nós ficaríamos com o Congresso aberto, de Casa cheia, até 31 de agosto. Faríamos trinta dias de campanha em recesso oficial, remunerado.
Estamos aqui no faz-de-conta. Como disse o Ministro Marco Aurélio, este é o País do faz-de-conta. Estamos fingindo que fazemos uma sessão do Senado, estamos em casa sem trabalhar. Estou em Manaus há quase um mês, recebendo, sem fazer nada " para o Congresso Nacional, pelo menos. Como se ter animação em um País como este com um Presidente que, até poucos meses atrás, era sabidamente " como o é " um Presidente conivente com um dos piores escândalos de corrupção que já aconteceu neste País e este Presidente está marchando para ser eleito, talvez, em primeiro turno? É desinformação da população? Não, não é. Se fizermos uma enquete em qualquer lugar deste País, todos concordarão, ou a grande maioria, que o Presidente sabia de tudo. Então, votam nele sabendo que ele sabia. A crise ética não é só da classe política, não. Parece que ela atinge grande parte da sociedade brasileira. Ele vai voltar porque o povo quer que ele volte. Democracia é isso. Curvo-me à vontade popular, mas inconformado. Esta será uma das eleições mais decepcionantes da minha vida. É a declaração pública, solene, histórica do povo brasileiro de que desvios éticos por parte de governantes não têm mais importância. Isso vem até da classe dos intelectuais, dos artistas. Que episódio deplorável aquele que aconteceu no Rio de Janeiro semana passada! Artistas, numa manifestação de solidariedade ao Presidente, com declarações cínicas, desavergonhadas! Um compositor dizer que "política é isso mesmo, fez o que deveria fazer", o outro dizer que "política é meter a mão na 'm...'"! Um artista, em qualquer país do mundo, é a consciência crítica de uma nação. Aqui é essa, é isso que é a classe artística brasileira, pelo menos uma grande parte dela, é o povo conivente com isso.
E pior, pior ainda: os artistas estão fazendo isso em interesse próprio, porque recebem de empresas públicas contratos milionários - isso é a putrefação moral deste País - , e o povo vai reconduzir o Presidente porque "política é isso mesmo".
Tenho quatro anos de Senado. Não me candidatarei em 2010, não quero mais viver a vida pública. Vou cumprir o mandato que o povo do Amazonas me deu, não vou silenciar. Ele pode ser eleito com 99,9%. Eu estarei aí na tribuna dizendo que ele deveria ter sido mesmo destituído.
O que ele fez é muito grave. É muito grave. Curvo-me à vontade popular, mas não sem o sentimento de profunda indignação. A classe política já nem se fala, essa já apodreceu há muito tempo mesmo. Este Congresso que está aqui, desculpem-me a franqueza, é o pior de que já participei. É a pior legislatura da qual já participei. Nunca vi um Congresso tão medíocre. Claro, com uma minoria ilustre, respeitável, a quem cumprimento. Mas uma maioria, infelizmente, tão medíocre, com nível intelectual e moral tão baixo, eu nunca vi. O que se pode esperar disso aí? Não sei. Eu não vou mais perder o meu tempo. Vou continuar protestando sempre, cumprindo o meu dever. Não teria justificativa dizer que não vou fazer mais nada. Vou cumprir rigorosamente o meu dever neste Senado até o último dia de mandato, mas para cá não quero mais voltar, não!
Um País que tem um Congresso desse, que tem uma classe política dessa, que tem um povo... dizem que político não deve falar mal do povo. Eu falo, eu falo. Parte da população que compactua com isso? É lamentável. E que sabe. Não é por desinformação, não. E que não é só o povão, não. É parte da elite, inclusive intelectual. Compactuam com isso é porque são iguais, se não piores. Vou continuar nessa vida pública? Para quê, para mim, chega!
Vou continuar pelejando pelos jornais e por todos os meios possíveis, mas, como ator na vida política e na vida pública deste País, depois de 2010, não quero mais! Elejam quem vocês quiserem! Podem chamar até o Fernandinho Beira-Mar e fazê-lo Presidente da República - ele não vai com o meu voto, mas, se quiserem, façam-no.
O meu desalento é profundo. Deixo isso registrado nos Anais do Senado Federal. Infelizmente, eu gostaria de estar fazendo outro tipo de pronunciamento, mas falo o que penso, perdendo ou não votos " pouco me importa". Aliás, eu não quero mais votos mesmo, pois estou encerrando a minha vida pública daqui a quatro anos, profundamente desencantado com ela.
Muito obrigado, Sr. Presidente".
Discurso de Jefferson Péres (2008)
Este é o último discurso do Senador Jefferson Péres, antes de sua morte. Foi proferido na Tribuna do Senado Federal e seu objetivo era comentar uma matéria recentemente publicada pelo "The New York Times", sobre a Floresta Amazônica.
"Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o correspondente no Rio de Janeiro do jornal The New York Times publicou uma matéria, ontem ou anteontem, com o título: “Amazônia, de quem é afinal?”
O texto insinua, levanta mais uma vez a tese da soberania relativa do Brasil sobre a região, que poderia no futuro ficar sob jurisdição internacional.
Normalmente eu não dou importância a essas manifestações, Sr. Presidente. Acho que muitos brasileiros sofrem de complexo de inferioridade e dão muita importância ao que é publicado nos jornais da Europa e dos Estados Unidos, uma atitude de quem ainda olha quase que com veneração os países mais desenvolvidos.
Pergunto-me se um membro do congresso americano subiria à tribuna para comentar matéria publicada em jornais do Brasil, seja O Globo seja a Folha de S.Paulo. Creio que não. Por que, então, eu subo à tribuna para comentar matéria do The New York Times? Porque vejo muitos brasileiros preocupados, mandando e-mails, pedindo uma resposta àquele jornal. Respondo por isto, apenas por isto, como satisfação a esses brasileiros, porque eu mesmo não dou maior importância ao que é publicado lá ou na Europa.
Por isso, creio que, longe de reagirmos enraivecidos ou mostrando medo de uma possível internacionalização da Amazônia, devemos replicar com bom humor, no mesmo tom, respondendo ao correspondente do jornal americano o que disse certa vez o Senador Cristovam Buarque numa universidade americana. Quando um universitário perguntou-lhe se a Amazônia, pela sua importância para o equilíbrio climático mundial, não deveria ser internacionalizada, o Senador Cristovam respondeu ao seu aparteante: “Eu até concordaria em debater a internacionalização da Amazônia se os Estados Unidos admitirem debater a internacionalização da Califórnia, por exemplo”.
A Califórnia é um Estado que está ameaçada por encontrar-se sobre a falha geológica de San Andreas e um dia pode sofrer um megaterremoto. Os Estados Unidos estarão cuidando bastante da Califórnia para evitar essa catástrofe? Quem sabe a ONU não poderia cuidar disso. Ou o Alasca? Esse Estado, em sua maior parte, está situado acima do Círculo Polar Ártico, onde se faz exploração de petróleo com risco de graves acidentes ambientais. Por que não se discutir a internacionalização do Alasca? A um francês se diria: “Paris é uma cidade importante demais para ficar apenas sob soberania francesa; uma cidade que, pela sua beleza, pelo seu patrimônio histórico e arquitetônico, deveria estar também sob jurisdição internacional.”
Assim poderíamos responder a todos, de qualquer país, nesse tom de deboche, Sr. Presidente, porque não se pode levar a sério a tese da internacionalização da Amazônia. Primeiro: por quem seria feita a internacionalização? Pela ONU? A Carta da ONU não dá poderes a essa organização para retirar território de nenhum país. Isso não encontra amparo jurídico. A ONU não pode fazer isso. Quem faria a internacionalização? Uma intervenção americana? Não seria internacionalização, seria uma invasão, seria um ato imperialista impensável, Senador Garibaldi Alves, e absolutamente impossível no contexto do mundo atual. O Brasil não é Iraque nem Afeganistão. O Brasil é um país com uma economia hoje pujante, com uma democracia consolidada, em pleno Ocidente, um país cada vez mais respeitado em todos os foros internacionais. Alguém imaginaria possível uma intervenção militar americana para retirar de nossa soberania a Amazônia? Isso é impensável, Senador Garibaldi Alves.
No entanto, essas manifestações com essa tese absurda, em defesa dessa tese absurda, nos devem levar a refletir sobre a nossa responsabilidade.
A Amazônia brasileira é nossa e continuará sendo sempre. Mas nós temos uma enorme responsabilidade sobre aquela região, da qual eu sou oriundo e que eu represento nesta Casa, Sr. Presidente.
Há três situações-limite que podem levar, sim, a comunidade internacional a ser muito cobradora do Brasil. A primeira situação-limite seria uma devastação florestal, um holocausto ecológico que chocaria o mundo inteiro.
A segunda situação-limite seria, como está acontecendo no Estado do Amazonas, um processo de pauperização que levará aquela população, fatalmente, se não houver um processo de desenvolvimento com eqüidade social, a ficar, logo, logo, refém do narcotráfico, situada ali na fronteira do Peru e da Colômbia, porque, à falta de meios de sobrevivência, será presa fácil das organizações criminosas que usam o Amazonas como rota de passagem. A terceira situação-limite seria nós realmente, com o nosso descaso habitual nas áreas de educação e pesquisa, sentarmos em cima da mais rica biodiversidade do Planeta, não pesquisarmos, e não deixarmos que pesquisem.
O Brasil, por ter soberania sobre a Amazônia, não tem o direito de não procurar investigar, pesquisar e aproveitar, em benefício da humanidade, toda a riqueza do bioma amazônico.
Se não fizermos isso, se não deixarmos que outros pesquisem, estaremos sendo irresponsáveis também.
Portanto, Sr. Presidente, é isso que pode acontecer de ruim para nossa região.
Quanto à proposta de internacionalização, Senador João Pedro, é sair para o deboche mesmo. Quando os americanos quiserem internacionalizar, vamos internacionalizar a Califórnia, a França; vamos internacionalizar Paris.
Concedo-lhe o aparte, Senador João Pedro.
O Sr. João Pedro (Bloco/PT – AM) – Senador Jefferson Péres, V. Exª faz uma reflexão sobre a Amazônia e sobre a importância do debate internacional. Venho dizendo que nós, do Brasil, precisamos cobiçar mais essa grande região, que é estratégica. Concordo com V. Exª: politicamente, não há hoje condições de haver uma intervenção territorial, internacional, de qualquer país. Politicamente, não há. Agora me preocupa – e por isso falo que precisamos cobiçar mais a Amazônia – a falta de investimento nas pesquisas. O nosso Inpa, Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, precisa ter um orçamento mais robusto – e melhorou este ano! –, precisa de mais atenção, precisa cumprir uma função mais estratégica. Estou falando não só do Inpa, na Amazônia, mas das nossas universidades federais. A presença das Forças Armadas também faz parte desse contexto no sentido de ocupar a Amazônia, mas dando uma função social e estratégica para essa região. Outra questão que venho levantando é o fortalecimento da OTCA, organização que também é importante não só para o Brasil, mas para juntar todos os países que compõem a nossa Amazônia. Militarmente, politicamente, não há conjuntura para isso. Agora, há outra forma de ir ferindo, maculando a nossa Amazônia: a pirataria. Daí a importância de as nossas instituições de vigilância ali terem mais recursos; precisamos ampliá-las. O Sivam/Sipam foi uma conquista para a Amazônia. Há avanços importantes, mas precisamos ter mais recursos, mais planejamento, principalmente o planejamento entre os nossos Ministérios; uma ação mais coordenada com foco sobre os interesses da Amazônia. A Amazônia continua estratégica, é importante para o povo brasileiro, para os países amazônicos e para o mundo. Agora, ela é nossa! E concordo com as observações de V. Exª sobre essa coisa de ser patrimônio da humanidade. Ela é patrimônio brasileiro e pode servir, sim, à humanidade, com mais pesquisa, com mais conhecimento. Então, parabenizo V. Exª pela reflexão que faz sobre esse território tão bonito, tão importante, tão presente para o Brasil.
O SR. JEFFERSON PÉRES (PDT – AM) – Obrigado, Senador João Pedro. V. Exª tem razão nos três pontos que focalizou em seu aparte.
Em primeiro lugar, o Brasil precisa investir maciçamente em pesquisa. Agora mesmo recebi expediente do Ministro da Ciência e Tecnologia sobre o aumento de dotações para o nosso Inpa. Nós, a bancada, já temos uma reunião agendada com ele para pedir que o Inpa seja ainda mais prestigiado pelo Governo Federal. Não só o Inpa, mas os centros de biotecnologia, por exemplo, e as universidades federais.
O segundo ponto a que V. Exª se referiu é a presença maior e no sentido social das Forças Armadas.
Senador João Pedro, creio que – e já disse isso ao Ministro da Defesa, Nelson Jobim – os efetivos, principalmente do Exército, entre as três Armas, deveriam ser multiplicados na região, não apenas para a defesa do arco de fronteira, mas para se transformarem em agentes comunitários a percorrerem todos os beiradões, levando assistência às populações ribeirinhas.
Em terceiro lugar, a OTCA, Organização do Tratado de Cooperação Amazônica, criada há 30 anos. Temos uma secretaria executiva aqui, em Brasília, Senador João Pedro, e a OTCA não sai do papel. Como se fala tanto em integração da América do Sul, tanto em desenvolvimento da Amazônia, e não se dá uma ação efetiva para fazer a integração, realmente, Senador Garibaldi Alves, da chamada Panamazônia?
Meus compatrícios, deixem de se assustar tanto com a suposta internacionalização da Amazônia. Isso não vai acontecer. Agora, por favor, acionem as autoridades brasileiras para cuidarem melhor da região. Não tenho tanto medo da cobiça internacional sobre a Amazônia. Tenho medo da cobiça nacional sobre a Amazônia, da ação de madeireiros, de pecuaristas e de outros que podem provocar, repito, o holocausto ecológico naquela região".
"Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o correspondente no Rio de Janeiro do jornal The New York Times publicou uma matéria, ontem ou anteontem, com o título: “Amazônia, de quem é afinal?”
O texto insinua, levanta mais uma vez a tese da soberania relativa do Brasil sobre a região, que poderia no futuro ficar sob jurisdição internacional.
Normalmente eu não dou importância a essas manifestações, Sr. Presidente. Acho que muitos brasileiros sofrem de complexo de inferioridade e dão muita importância ao que é publicado nos jornais da Europa e dos Estados Unidos, uma atitude de quem ainda olha quase que com veneração os países mais desenvolvidos.
Pergunto-me se um membro do congresso americano subiria à tribuna para comentar matéria publicada em jornais do Brasil, seja O Globo seja a Folha de S.Paulo. Creio que não. Por que, então, eu subo à tribuna para comentar matéria do The New York Times? Porque vejo muitos brasileiros preocupados, mandando e-mails, pedindo uma resposta àquele jornal. Respondo por isto, apenas por isto, como satisfação a esses brasileiros, porque eu mesmo não dou maior importância ao que é publicado lá ou na Europa.
Por isso, creio que, longe de reagirmos enraivecidos ou mostrando medo de uma possível internacionalização da Amazônia, devemos replicar com bom humor, no mesmo tom, respondendo ao correspondente do jornal americano o que disse certa vez o Senador Cristovam Buarque numa universidade americana. Quando um universitário perguntou-lhe se a Amazônia, pela sua importância para o equilíbrio climático mundial, não deveria ser internacionalizada, o Senador Cristovam respondeu ao seu aparteante: “Eu até concordaria em debater a internacionalização da Amazônia se os Estados Unidos admitirem debater a internacionalização da Califórnia, por exemplo”.
A Califórnia é um Estado que está ameaçada por encontrar-se sobre a falha geológica de San Andreas e um dia pode sofrer um megaterremoto. Os Estados Unidos estarão cuidando bastante da Califórnia para evitar essa catástrofe? Quem sabe a ONU não poderia cuidar disso. Ou o Alasca? Esse Estado, em sua maior parte, está situado acima do Círculo Polar Ártico, onde se faz exploração de petróleo com risco de graves acidentes ambientais. Por que não se discutir a internacionalização do Alasca? A um francês se diria: “Paris é uma cidade importante demais para ficar apenas sob soberania francesa; uma cidade que, pela sua beleza, pelo seu patrimônio histórico e arquitetônico, deveria estar também sob jurisdição internacional.”
Assim poderíamos responder a todos, de qualquer país, nesse tom de deboche, Sr. Presidente, porque não se pode levar a sério a tese da internacionalização da Amazônia. Primeiro: por quem seria feita a internacionalização? Pela ONU? A Carta da ONU não dá poderes a essa organização para retirar território de nenhum país. Isso não encontra amparo jurídico. A ONU não pode fazer isso. Quem faria a internacionalização? Uma intervenção americana? Não seria internacionalização, seria uma invasão, seria um ato imperialista impensável, Senador Garibaldi Alves, e absolutamente impossível no contexto do mundo atual. O Brasil não é Iraque nem Afeganistão. O Brasil é um país com uma economia hoje pujante, com uma democracia consolidada, em pleno Ocidente, um país cada vez mais respeitado em todos os foros internacionais. Alguém imaginaria possível uma intervenção militar americana para retirar de nossa soberania a Amazônia? Isso é impensável, Senador Garibaldi Alves.
No entanto, essas manifestações com essa tese absurda, em defesa dessa tese absurda, nos devem levar a refletir sobre a nossa responsabilidade.
A Amazônia brasileira é nossa e continuará sendo sempre. Mas nós temos uma enorme responsabilidade sobre aquela região, da qual eu sou oriundo e que eu represento nesta Casa, Sr. Presidente.
Há três situações-limite que podem levar, sim, a comunidade internacional a ser muito cobradora do Brasil. A primeira situação-limite seria uma devastação florestal, um holocausto ecológico que chocaria o mundo inteiro.
A segunda situação-limite seria, como está acontecendo no Estado do Amazonas, um processo de pauperização que levará aquela população, fatalmente, se não houver um processo de desenvolvimento com eqüidade social, a ficar, logo, logo, refém do narcotráfico, situada ali na fronteira do Peru e da Colômbia, porque, à falta de meios de sobrevivência, será presa fácil das organizações criminosas que usam o Amazonas como rota de passagem. A terceira situação-limite seria nós realmente, com o nosso descaso habitual nas áreas de educação e pesquisa, sentarmos em cima da mais rica biodiversidade do Planeta, não pesquisarmos, e não deixarmos que pesquisem.
O Brasil, por ter soberania sobre a Amazônia, não tem o direito de não procurar investigar, pesquisar e aproveitar, em benefício da humanidade, toda a riqueza do bioma amazônico.
Se não fizermos isso, se não deixarmos que outros pesquisem, estaremos sendo irresponsáveis também.
Portanto, Sr. Presidente, é isso que pode acontecer de ruim para nossa região.
Quanto à proposta de internacionalização, Senador João Pedro, é sair para o deboche mesmo. Quando os americanos quiserem internacionalizar, vamos internacionalizar a Califórnia, a França; vamos internacionalizar Paris.
Concedo-lhe o aparte, Senador João Pedro.
O Sr. João Pedro (Bloco/PT – AM) – Senador Jefferson Péres, V. Exª faz uma reflexão sobre a Amazônia e sobre a importância do debate internacional. Venho dizendo que nós, do Brasil, precisamos cobiçar mais essa grande região, que é estratégica. Concordo com V. Exª: politicamente, não há hoje condições de haver uma intervenção territorial, internacional, de qualquer país. Politicamente, não há. Agora me preocupa – e por isso falo que precisamos cobiçar mais a Amazônia – a falta de investimento nas pesquisas. O nosso Inpa, Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, precisa ter um orçamento mais robusto – e melhorou este ano! –, precisa de mais atenção, precisa cumprir uma função mais estratégica. Estou falando não só do Inpa, na Amazônia, mas das nossas universidades federais. A presença das Forças Armadas também faz parte desse contexto no sentido de ocupar a Amazônia, mas dando uma função social e estratégica para essa região. Outra questão que venho levantando é o fortalecimento da OTCA, organização que também é importante não só para o Brasil, mas para juntar todos os países que compõem a nossa Amazônia. Militarmente, politicamente, não há conjuntura para isso. Agora, há outra forma de ir ferindo, maculando a nossa Amazônia: a pirataria. Daí a importância de as nossas instituições de vigilância ali terem mais recursos; precisamos ampliá-las. O Sivam/Sipam foi uma conquista para a Amazônia. Há avanços importantes, mas precisamos ter mais recursos, mais planejamento, principalmente o planejamento entre os nossos Ministérios; uma ação mais coordenada com foco sobre os interesses da Amazônia. A Amazônia continua estratégica, é importante para o povo brasileiro, para os países amazônicos e para o mundo. Agora, ela é nossa! E concordo com as observações de V. Exª sobre essa coisa de ser patrimônio da humanidade. Ela é patrimônio brasileiro e pode servir, sim, à humanidade, com mais pesquisa, com mais conhecimento. Então, parabenizo V. Exª pela reflexão que faz sobre esse território tão bonito, tão importante, tão presente para o Brasil.
O SR. JEFFERSON PÉRES (PDT – AM) – Obrigado, Senador João Pedro. V. Exª tem razão nos três pontos que focalizou em seu aparte.
Em primeiro lugar, o Brasil precisa investir maciçamente em pesquisa. Agora mesmo recebi expediente do Ministro da Ciência e Tecnologia sobre o aumento de dotações para o nosso Inpa. Nós, a bancada, já temos uma reunião agendada com ele para pedir que o Inpa seja ainda mais prestigiado pelo Governo Federal. Não só o Inpa, mas os centros de biotecnologia, por exemplo, e as universidades federais.
O segundo ponto a que V. Exª se referiu é a presença maior e no sentido social das Forças Armadas.
Senador João Pedro, creio que – e já disse isso ao Ministro da Defesa, Nelson Jobim – os efetivos, principalmente do Exército, entre as três Armas, deveriam ser multiplicados na região, não apenas para a defesa do arco de fronteira, mas para se transformarem em agentes comunitários a percorrerem todos os beiradões, levando assistência às populações ribeirinhas.
Em terceiro lugar, a OTCA, Organização do Tratado de Cooperação Amazônica, criada há 30 anos. Temos uma secretaria executiva aqui, em Brasília, Senador João Pedro, e a OTCA não sai do papel. Como se fala tanto em integração da América do Sul, tanto em desenvolvimento da Amazônia, e não se dá uma ação efetiva para fazer a integração, realmente, Senador Garibaldi Alves, da chamada Panamazônia?
Meus compatrícios, deixem de se assustar tanto com a suposta internacionalização da Amazônia. Isso não vai acontecer. Agora, por favor, acionem as autoridades brasileiras para cuidarem melhor da região. Não tenho tanto medo da cobiça internacional sobre a Amazônia. Tenho medo da cobiça nacional sobre a Amazônia, da ação de madeireiros, de pecuaristas e de outros que podem provocar, repito, o holocausto ecológico naquela região".
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