quarta-feira, fevereiro 18, 2009

Zimbabue: 1 trilhão por cento de inflação

Ele gosta de culpar o imperialismo europeu por todos os males do país. Se a economia registra 1 trilhão por cento de inflação anual a culpa é dos europeus. Se no interior do país as pessoas comem ratos para matar a fome, os responsáveis são novamente os europeus neo-liberais. A cólera, transformada em uma epidemia que matou mais de 4 mil pessoas, também é culpa dos europeus, especificamente dos britânicos que utilizaram a doença como uma “arma bacteriológica” para justificar uma invasão ao país, segundo afirmação do ministro da Informação do país.

Apesar da retórica, o Zimbabue, país que viveu 100 anos sob o domínio da coroa britânica, vem sofrendo nos últimos anos o maior malefício que qualquer nação pode sofrer. Seu nome é ditadura.

Sob o regime de Robert Mugabe, um antigo herói nacional alçado ao poder pela revolução, o Zimbabue bate sucessivos récordes negativos em sua história. Conhecida como a “Suiça da África”, bastaram 30 anos de governo para que o sistema de educação e saúde, dentre os melhores de todo o continente, se transformasse em algo parecido com um “nada”. A agricultura está esfacelada e ¼ da população fugiu do país para tentar a sorte em qualquer outro lugar.

MUGABE
Em janeiro de 1980, 200 mil pessoas se juntaram no bairro negro de Highfield para ouvir o revolucionário Robert Mugabe que voltava do exílio. Naquele tempo, o Zimbábue se chamava Rodésia e a capital era conhecida como Salisbury. Com um discurso conciliador, ele prometeu tolerância racial para um povo que viveu 100 anos sob o colonialismo britânico e outros 15 debaixo do porrete do regime racista de Ian Smith.

A promessa pôs Mugabe na lista de favoritos ao Prêmio Nobel da Paz e os diplomatas estrangeiros passaram a se referir ao Zimbábue como a "Suíça da África". O país exportava trigo, tinha boas estradas e o melhor sistema educacional do continente.Hoje, 30 anos depois, o arauto da esperança virou o homem mais odiado da África. Com uma inflação de 1 trilhão por cento ao ano e uma epidemia de cólera que já matou mais de 4 mil pessoas, muitos zimbabuanos estão comendo ratos para sobreviver em aldeias no interior.

GUERRA BACTERIOLÓGICA
O ministro de Informação Sikhanyiso Ndlovu acusou o governo britânico de usar deliberadamente a cólera como arma de "guerra bacteriológica" para justificar uma invasão militar no Zimbábue, informou ha cerca de dois meses o jornal governamental The Herald. A ruína do país se confunde com história de Mugabe. Assim como outros líderes africanos, ele é produto da lógica missionária européia. Filho de um carpinteiro e de uma professora de catecismo, ele cresceu em uma aldeia jesuíta e estudou em colégio católico. A educação rigorosa o manteve longe do cigarro e da bebida - até hoje. Na adolescência, a disciplina jesuítica lhe rendeu uma bolsa para estudar arte na Universidade Fort Hare, na África do Sul, onde foi apresentado ao marxismo e às idéias de Mahatma Gandhi, modelo dos nacionalistas africanos - mais tarde ele ainda receberia diplomas de administração, educação e direito, todos por correspondência.

Mugabe deu aulas em Gana, onde foi contagiado pelo anticolonialismo dos anos 50. De volta à Rodésia, em 1960, ele se envolveu em partidos políticos negros, que se se tornaram guerrilhas depois que os brancos fizeram a independência, em 1965. A guerrilha rodesiana refletia a divisão do país. No sul, vivem os ndebeles, que são 25% da população. O norte é dominado pelos três quartos restantes de etnia shona, grupo do qual Mugabe tornou-se líder. Em 1986, a rivalidade foi a razão do massacre de 20 mil ndebeles por agentes do governo.

Para analistas, a chance de ser julgado por genocídio em um tribunal internacional é a razão pela qual Mugabe não deixa o poder. Aos poucos, a lua-de-mel dele com o Zimbábue chegou ao fim.

Para manter o regime de partido único, ele precisou construir uma base de poder, transformando o governo em um cabide de empregos onde a corrupção corre solta. O exemplo mais emblemático ocorreu em 1993, quando a empresa francesa Aéroport de Paris venceu a concorrência para construir o aeroporto de Harare. A licitação foi cancelada por Leo Mugabe, sobrinho do presidente, que entregou o projeto de US$ 80 milhões para uma firma do Chipre que pertencia a Hani Yamani, um milionário saudita - anos depois, Yamani disse que gastou US$ 3 milhões em suborno para membros do governo. Questionado sobre o caso, Mugabe disse que a corrupção era a chave para o controle do governo.

Na prática, com o setor privado reduzido, a única fonte de renda da população passou a ser o Estado. Outra tática para se manter no poder é tirar uma carta da manga sempre que está ameaçado. Em 2000, ele incentivou a invasão de fazendas de agricultores brancos. As terras foram distribuídas entre aliados, a maioria da elite de Harare que não sabe o que fazer com as propriedades. A agricultura entrou em colapso, mas a culpa foi outra vez colocada nas costas do imperialismo europeu. O problema de Mugabe é que as terras acabaram e não há mais brancos para expulsar. Um quarto da população já deixou o país. "Ele está ficando sem opções", disse ao jornal O Estado de São Paulo Judy Smith-Höhn, do Instituto de Estudos de Segurança de Pretória, na África do Sul.

Para ela, o regime de Mugabe desafia a lógica. "É incrível como ele se sustenta mesmo sem oferecer os serviços mais básicos."

A história recente do Zimbabue, contada aqui com fontes que pesquisei na Editora Abril, no Jornal O Estado de São Paulo e no site oficial do país, servem como uma referência histórica importante para entendermos melhor os impactos de políticas antidemocráticas em nações que poderiam ser bem melhor sucedidas caso preceitos como liberdade, livre escolha, eleições limpas e alternância de poder fossem prioridades. Não estou criando paralelos enre Zimbabue e Venezuela (citada no post abaixo), mesmo porque não acredito (por diversas razões: econômicas, estruturais e sociais) que o país sulamericano terá o mesmo fim, ainda que seja um alerta para reafirmar que inexistem ganhos econômicos e sociais para os povos que vivem sob ditaduras de quaisquer aspectos e posições ideológicas.

Chavez venceu mais uma contra o Imperialismo Americano!

Agora a “ditadura eleitoral” (esta nova modalidade), tem o caminho aberto para transformar a Venezuela definitivamente na mais nova ditadura da América Latina. Hugo Chavez, tornado elegível por tempo indeterminado, destruiu um dos elementos mais fundamentais das democracias: a alternância de poder.

O líder da Venezuela foi beneficiado pelo uso das reservas econômicas nacionais, as quais permitiram ao governo manter a estratégia de investimento nos programas sociais, fazendo com que a população não sentisse os efeitos da forte queda dos preços do barril do petróleo, principal fonte econômica do país. Além disso, utilizou todos os meios escusos para combater os partidários do “Não”.

Chavez imagina (e isso de fato deve ocorrer) que os preços do barril irão subir a patamares que ofereçam condições para a manutenção política da chamada revolução bolivariana e isso certamente lhe garantirá muitos e muitos anos no poder.

É estranho presenciar esses momentos históricos em que países fazem escolhas que jamais deram certo em qualquer lugar do mundo. Foi assim com outros países como a Coréia do Norte, o Zimbabue e esta sendo assim com o Equador, a Bolívia e a Venezuela.

Quando estive no ano passado no Equador discuti com uma família de classe média sobre as razões que faziam com que todos apoiassem a reforma constitucional de Rafael Correa, o aprendiz de ditador. Eles diziam que Correa havia feito mudanças radicais na sociedade e que seu poder concentrado não era visto com preocupação, pois as pessoas queriam melhores condições de vida e era isso o que importava. Ao que eu perguntei se conheciam alguma experiência histórica antidemocrática que resultara em benefícios sociais e fortalecimento econômico do país por longos períodos e era evidente que eles não tinham qualquer exemplo para dar.

Com uma boliviana a discussão foi muito parecida, mas o argumento de que Evo Morales nasceu pobre, viveu como um pequeno agricultor que vendia a sobra de sua produção na cidade e que subiu na vida por seus próprios méritos bastavam para justificar quaisquer políticas típicas de um regime de exceção.

Não é o meu desejo que o povo desses países passem por privações de quaisquer natureza, mas vale lembrar que a democracia, com todos os seus pilares que a compõe, ainda é o único sistema que pode proporcionar desenvolvimento econômico e qualidade de vida.

Mas a culpa não é somente daqueles que votam a favor de regimes de exceção ou em ditadores, mas sim do processo histórico que fez com que muitos povos acreditassem que o capitalismo é tão somente um regime de exploração em que o ganho é zero para aqueles que não são detentores dos meios de produção.

Dessa forma, ao explorar até o limite as riquezas e possibilidades de diversas nações, seus habitantes, jogados à margem do processo de enriquecimento econômico, não conseguem vislumbrar outra saída para a melhoria de sua qualidade de vida senão oferecendo oportunidades de reiterar o poder de ditadores e proto-ditadores, ainda que não saibam que o resultado deste processo será infinitamente pior para todos, menos para os líderes e seus asseclas.